quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Lição de Casa

Quando eu era criança pequena lá em Botucatu, eu tinha uma enorme dificuldade em compreender muitas coisas como:"Por que eu tenho que fazer lição de casa? Eu já passo metade do meu dia sentada lá na escola!". Essa lembrança me veio hoje, enquanto eu tenho três trabalhos da faculdade para fazer e uma vontade imensa de escrever outra coisa, qualquer coisa que deixe meus dedos escorregar no teclado.
     Minha indignação era tanta perante alguns deveres de matemática insolúveis que um dia eu tive um ataque de nervos e rasguei a folha da lição. Ninguém me esfolou por causa disso, minha mãe só me disse que eu teria que contar para professora, no dia seguinte, o que tinha acontecido com a minha lição. E eu não me lembro o que eu disse nem as consequências daquele gesto de fúria infantil. Lembro só da imagem e da vergonha que eu senti antes de começar a falar, parecia muito idiota eu ter rasgado tudo.
   Naquela época eu olhava para a estante de livros e achava que o mundo poderia estar ali, não no meu livro de matemática.  Então eu pegava um deles olhava, lia algumas partes e não entendia muita coisa, mas eu me sentia livre só pelo fato de eu poder escolher qualquer um aleatoriamente.
   Alguns anos depois, quando o caderno não era uma obrigação,  tive um professor de geometria muito severo, com o qual eu adquiri um monte de notas baixas. No final do ano veio de novo a questão das tarefas, ele disse: "Eu te dou um ponto pelo seu caderno de tarefas, traga-o amanhã". Subitamente veio o desespero, eu não tinha se quer um caderno! Cheguei para uma garota estudiosa e disse: "Me empresta o seu caderno?".
  Emoção. Saí correndo da escola, comprei um caderno e umas canetas coloridas, porque a garota escrevia de cores diferentes, então achei de bom tom copiar. Sentei na sala jantar abri espaço na mesa, olhei para o relógio e pensei "vou ficar o dia todo aqui". Na primeira página, do caderno da menina tinha escrito com canetinha: " GEOMETRIA". Me recusei a copiar, pulei duas páginas e comecei, copiei, disfarcei, fiz um desenho diferente. No final de duas horas tinha incrivelmente terminado o trabalho de um ano inteiro. E então olhei para estante de livros, e comecei a pensar que enquanto a menina fazia todos aqueles exercícios eu estava folhando aqueles livros, vendo TV ou simplesmente olhando a rua. E numa revolta dessa vez adolescente, resolvi me mostrar.
  Peguei o livro da Florbela Espanca e escrevi um poema dela, no lugar da capa. Nessa época eu arriscava uns versos também, e a cada lacuna intercalei, eu , Fernando Pessoa, até o senhor Bertold Brecht entrou na dança. E eu demorei bastante tempo selecionando aquilo tudo, talvez mais tempo do que eu tenha levado para copiar.
   Bem cheguei a escola e a vergonha me tomou de novo, pensei como sou idiota, ele vai me torturar. Então ele pegou o caderno, novo e sorriu um poco e me perguntou " Esse caderno é seu?" ao que eu disse sim e justifiquei que fazia anotações e passava a limpo em casa, mas eu nunca soube mentir e isso foi tão gaguejado que ele me cortou e disse "Veremos". Ele o abriu e se deparou com Florbela, leu o poema todo, com calma. Eu tinha esquecido de colocar o nome dela, ele virou com desdém e perguntou "Não foi você que escreveu isso, foi?" ao que eu respondi revoltada pelo desdem não, foi Florbela Espanca o meu é o da última página. Ele riu. Continuou folhando o caderno, parecia que em câmera lenta diante do meu desespero.
  Eu pensava "eu sou mesmo muito idiota era só ter copiado a porcaria das contas". Ele se deteve no meu poema, que eu sinceramente queria lembrar. Então veio o veredito, "Vou te dar o ponto pelo poema, é um bom poema e no mais eu gosto da Florbela Espanca". Eu nem sei qual foi o meu olhar, mas ele me disse no fim " Eu sempre soube que você nunca ia fazer contas". Confesso que doeu, porque eu sou orgulhosa, mas enquanto eu fui andando pela rua, me dei conta que ele foi a primeira pessoa desconhecida a quem eu tinha mostrado um poema. E pensei rindo, se nada der certo vou vender poemas à professores de matemática. Está aí uma tarefa, que eu posso fazer.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Sobre os sexos

Ele: Fala para mim qualquer coisa que não rime, por favor, estamos no século XXI. Diga uma coisa amorosa que não seja piegas, tente ser gentil sem usar frases feitas. Vamos, colabore. Não há nada de desumano
Ela: Viva a realidade.(tira a roupa)
Ele:  Obrigado.

(tempo)

Ela: Vontade louca de abrir a janela e ficar assim para sempre. Numa preguiça eterna. Sabe, de viver assim feito brisa.
Ele: Puts, tenho que trabalhar amanhã, vamos dormir? (veste a calça)
Ela: Obrigada.

(se viram na cama e dormem)