quinta-feira, 19 de junho de 2008

Passeio Noturno

O dia corria nublado, abafado, como se fosse um espelho dos pensamentos dessa nossa protagonista.
Casaco de lã, calças jeans, escolhera o banco mais escondido do ônibus (aquele que fica logo atrás do par de bancos que é mais alto), como se só ali, no meio dos mais diversos desconhecidos, onde ninguém a perguntaria como ela se sente, ela pudesse ser enfim ela mesma.
Se quisesse chorar, choraria. Não olhava nem quem se sentava a seu lado, grudava os olhos no vidro e via passando casas, viadutos, em silêncio, esperando que essa viagem urbana nunca chegasse ao fim. Torcia debilmente para haver trânsito para que pudesse ficar ali por mais tempo, porém a viagem chagara ao fim.
Desceu no ponto habitual, mas neste dia não tinha compromisso.
Andou, como se a vida só lhe fosse boa nestes momentos, estava farta de pensar em como queria dinheiro, amor, credibilidade, só caminhava, sentia o vento no rosto, o ar nos pulmões. A natureza dela era ser livre, só conseguia se sentir capaz de agir depois de momentos assim.
- Virgínea?
Não identificou a voz de imediato, assustou-se, a rua estava particularmente escura. Virou-se lentamente, achou que estava em um filme, era um seu “ex” que morava ali por perto, mas ela nunca o havia encontrado por acaso, ele se casara e não freqüentavam mais os mesmos lugares, era o tipo de pessoa que não se encontra por aí. Sim, porque ela tinha amigos com os quais ela nunca marcara nada nem tinha telefone, e sempre se encontravam; ele não, ele era o rapaz da hora marcada.
– Bruno, tudo bem? - deu-lhe um beijo, estava trêmula, afinal, ele a pegara sendo ela, assim tão livremente caminhando pela rua.
– Você está bonita - reparou ele. Sei lá, parece tranqüila.
– Estou muito bem - falou engrossando a voz em tom de brincadeira, ironizando um cowboy americano.
Ele sorriu, disse que tinha que ir e foi. Ela virou-se, o viu andando de costas, sua pressão caiu. Estava frágil. Não queria mais andar por aí, queria mesmo era ter um lugar a que pudesse ir como ele, um lugar para relaxar, se sentir parte, um lugar que, para onde quer que ela fosse, ela desejasse voltar.

Sheyla Coelho

Um comentário:

Eduardo Odassi Baroni disse...

Sheyla!
Parabéns, tanto pelos textos quanto pela iniciativa.
O blog tem um visual bem legal e os contos me pegaram na veia, com verdades que me identifiquei.
Está num bom caminho!
Du Baroni